Um Evangelho Absoluto para um mundo líquido através de uma Igreja Emergente?

Posted: quinta-feira, 20 de outubro de 2011 by Sung Ho in Marcadores: ,
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* Zigmunt Bauman, sociólogo polonês, muito apreciado pela academia brasileira, tem escrito uma série de livros traçando vários diagnósticos da sociedade de hoje, dita pós-moderna. O curioso é que em todos os seus títulos a palavra “líquido” está presente: Vida Líquida, Amor Líquido, Tempos Líquidos, Medo Líquido, etc. Sim, ele define o nosso mundo como sendo líquido.

Particularmente gosto dessa analogia. O mundo não possui mais uma forma definida de se pensar: todos tem capacidade de optarem por suas próprias verdades. Conceitos que antes eram intocáveis foram diluídos e relativizados: se o cristianismo falava até então da “verdade”, o nosso mundo propõe as “verdades”, pelo menos uma para cada sete bilhões de pessoas que habitam nosso planeta. Assim, o cristianismo foi deslocado de uma posição de absoluta incontestabilidade para a uma categoria quase que de um estilo de vida, que vai ao gosto do freguês.

Essa liquidez me traz um grande inquietamento, e nessa noite, gostaria de dividir com vocês apenas um, quando o assunto é Igreja Emergente: como ela consegue, ou conseguirá comunicar um Evangelho Absoluto para um mundo líquido, que não mais admite, por exemplo, categorizações dogmáticas? Como pensar n um Evangelho Absoluto para um mundo líquido através de uma Igreja Emergente?

Como dizer para um homossexual que ele não está vivendo de acordo com a vontade de Deus? 
Como expor um texto de Atos, por exemplo, na qual Lucas é explícito, ao citar o apóstolo Pedro, em dizer que não há salvação em nenhum outro nome, a não ser o de Jesus? 
E como apresentar um Cristo, que a si mesmo se identificou como sendo "o Caminho" diante da variedade imensa de caminhos alternativos que o mundo a pós-modernidade diz oferecer?

Para ser sincero, vejo pontos positivos no movimento de Igrejas Emergentes para cima dos trópicos, nos EUA e na Inglaterra, no sentido deles fazerem uma releitura, por exemplo, da estética, da liturgia, e até dos métodos de pregação, tornando a mensagem de Cristo, pelo menos mais inteligível a pessoas que na sua maioria vivem em grandes centros urbanos e que tiveram, já desde a suas infâncias, uma educação totalmente secularizada nas suas escolas.

Entretanto, creio que o ponto crítico do movimento não seja o uso de velas ou não, a recitação do Credo apostólico ou não, de se pregar de terno ou não, usar três pontos ou quatro páginas no sermão. Mas a maior inquietação está no fato de como a Igreja Emergente vem lidando com o Evangelho em si, entendido como fonte primária do Cristianismo.

O fato é que o Evangelho, diferente da pós-modernidade, não é liquida. Ele está mais para rocha e fundamento do que para uma relativização em termos de “gosto próprio” ou de uma liquidez que se amolda em qualquer canto e em qualquer cabeça.  Se a igreja emergente está pregando um Evangelho adaptado, ou seja, moldado aos ouvidos e às necessidades dos homens pós-modernos, excluindo de seus cânones a verdade incontestável e bíblica, por exemplo, da Criação do Universo por Deus, do sacrifício vicário e substitutivo de Jesus na Cruz, da depravação humana, da ação do Espírito Santo na vida das pessoas em tirá-las do pecado e levá-las para Deus, santificando-as, do céu, do inferno... Será mesmo que essa igreja, mesmo tendo o rótulo de emergente, está de acordo com aquilo que a define como igreja?

A essa inquietação se transforma em angústia quando ouço algumas frases como estas:
            “Estamos mais preocupados em manter relacionamentos verdadeiros do que discutir doutrina nessa igreja”
            “Queremos uma igreja mais aberta e livre sem o jugo do legalismo e de dogmas inflexíveis”.
            “Não precisamos de teólogos, para quê, se temos o Espírito Santo?”

Como pregador, como teólogo e como apaixonado pelo Evangelho de Deus, quero compartilhar essa quase que angústia também com vocês: da igreja emergente estar tão preocupada em se amoldar e se fazer comunicável ao mundo que acabe perdendo seu vínculo principal com Cristo que é o Evangelho, um Evangelho que não pode ser relativizado, que não pode ser lido apenas como um compêndio de lições morais, um Evangelho que constitui-se como A Verdade.

Oro, para que a Igreja Emergente siga um dos lemas da reforma: Eclesia reformata,semper reformanda secumdum verbum Dei, uma igreja reformada que sempre está se reformando de acordo com a Palavra de Deus, mas que também não ponha tudo a perder tentando amoldar um Evangelho Absoluto e firme aos padrões líquidos desse mundo pós-moderno que estamos vivendo. Precisamos sim, de tempos em tempos, nos reformarmos, mas sempre de acordo, e sempre cativos ao Evangelho de Cristo. Que Deus nos ajude. Amém.


* Devocional feita na 2a. Semana de Estudos Teológicos no Seminário Servo de Cristo em 19.10.2011

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